domingo, 24 de maio de 2009

A CADEIA

Para que tenhas o que é teu
Para que pertenças ao espaço que eu tentei invadir
Eu me esquivo de ti
Embora continue a vigiar
noite e dia

Te dou o silêncio que você pediu
Pois desde o início eu não ouvi
A queixa gentil contra o meu afeto

Se meu abraço te impede de se livrar de mim
Se sufocada estás pelo meu excesso de zelo
Eu te deixo sair
Fugindo de ti
como um leão acuado
e com medo.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

MAÍSA E OS MONSTROS



A expressão tensa da menina no palco parecia indicar que algo não estava bem. Primeiro, ela se soltou bruscamente da mão do apresentador e se afastou dele, lívida e trêmula; logo depois, de olhos arregalados, ela viu aparecer no estúdio a rídicula figura de outra criança, fantasiada toscamente como um "monstro". Certo, o tal monstro não assustaria quase ninguém. Mas no caso da garota de seis anos chamada Maísa, atualmente a principal "atração" do programa dominical de Sílvio Santos, foi o bastante para que ela entrasse em pânico, e fugisse aos berros do estúdio. A platéia veio abaixo com as gargalhadas, como se aquilo fosse um show de palhaços. O apresentador chamava a menina em vão, pedindo que ela voltasse. Ela voltou, mas pouco depois, incitada pelo apresentador, que ameaçava trazer o "monstrinho" de volta, ela deixou o estúdio para não voltar mais. Sílvio Santos repetia: "essa Maísa não tem jeito mesmo...". Ora, trata-se de uma criança de seis anos. Por mais que ela pareça "espontânea" e "extrovertida" ela não deveria ser exposta a ridicularização pública a que é submetida toda tarde de domingo. Por mais que suas respostas às provocações do apresentador pareçam "inteligentes", ela não tem o discernimento e capacidade de julgamento necessários; é uma criança, e como reza o ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente - , deve ser preservada de situações constrangedoras e vexatórias, ou de ser exposta ao ridículo. O apresentador a provoca até o limite da sua paciência, para que ela, na sua inocência, faça o público cair na risada. Algumas pessoas com quem conversei sobre o assunto justificam a participação de Maísa no programa pela quantidade de dinheiro que ela deve receber pela atração, pelo "sucesso" que ela representa, pelos pontos de audiência que deve roubar das emissoras concorrentes. Ora, ela talvez não tenha consciência disso tudo, nem a noção do quanto "vale" no mercado televisivo - ela já foi "disputada" por outros canais. Maísa sequer pode usufruir legalmente de todo o dinheiro que tem. A administração dos ganhos dela deve estar nas mãos de alguém contratado pelos pais.
Num mercado como a televisão, em que toda novidade é perecível, não há de durar muito para que passe o "efeito Maísa" e ela caia no esquecimento, sendo substituída por outra bizarrice dessa natureza. No momento em que ela não gerar mais audiência (e lucros), quando o público não tiver mais interesse, quando se esgotarem todas as surradas piadas do apresentador para fazer a garotinha ficar nervosa, brava e sair correndo chorando, aí então é só colocar outra coisa no ar.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

CINCO FRAÇÕES DE UMA QUASE HISTÓRIA


(Cinco Frações de uma Quase História, Brasil, 2008, 96 min. Direção dos episódios por Armando Mendz, Cristiano Abud, Cris Azzi, Guilherme Fiúza, Lucas Gontijo e Thales Bahia. Com Cláudio Jaborandy, Cynthia Falabella ,Gero Camilo,Jece Valadão,Leonardo Medeiros,Luiz Arthur,Murilo Grossi,Nivaldo Pedrosa. Disponível em DVD)

Você está cercado de malucos. Isso mesmo. Todos nessa cidade tem alguma coisa de loucura, em menor ou maior grau. São dois milhões e quatrocentas mil pessoas - sem contar as que vem de fora - vivendo a dor e a delícia da metrópole, negociando permanentemente com o caos, contra o tempo, buscando incessantemente um produto caro e difícil de se encontrar no mercado: a felicidade. Uma mercadoria que pode vir embalada de diversas formas. Bem perto, no carro ao lado, no assento do ônibus atrás de você, na fila do banco, no supermercado da esquina, há pessoas de todos os tipos, e você nem imagina do que elas são capazes. No meio de toda essa gente, vamos encontrar nesse "Cinco Frações de Uma Quase História" cinco tipos estranhos, cinco pessoas esquisitas, cinco histórias de vida que, no paroxismo de suas atitudes, no auge das suas paranóias e neuroses são muitos parecidos com todos nós. São animais urbanos. Pode ser alguém como um fotógrafo obcecado pelos pés femininos e os persegue pelas ruas, pode ser também um sujeito que se projeta nas imagens que vê na televisão, pode ser um reles funcionário de repartição que vê na proposta indecorosa do chefe uma chance de sair da vida mesquinha e medíocre que leva; pode ser uma secretária desiludida no amor que sonha em se casar, nem que seja na marra. Ou ainda pode ser um empregado de matadouro que pensa em se vingar da traição da mulher. São cinco seres humanos. O filme foi todo rodado em locações em Belo Horizonte, que aqui aparece nobre e discreta, como um pano de fundo para as histórias narradas, que em algum ponto se cruzam, sem contudo se tocar. Como acontece quando passamos por um estranho na rua. Por um instante ele pode até chamar sua atenção por causa de alguma atitude inusitada, mas logo depois segue levando a vida e você nunca mais o vê.
Assista ao trailer e leia mais sobre "Cinco Frações" no ótimo site oficial: www.cincofracoes.com.br/