sábado, 17 de dezembro de 2011

o amor é uma questão de timing

domingo, 16 de outubro de 2011

A CHUVA NOS TELHADOS ANTIGOS

A CHUVA NOS TELHADOS ANTIGOS (Brasil, 2006, 15min) Adaptação de conto de Luiz Vilela. Direção por Rafael Conde. Com Mônica Ribeiro, Alexandre Cioletti. Leia o conto original aqui.

SANTA EFIGÊNIA A SAVASSI

Deu no jornal que, em São Paulo, mais de 80% dos cobradores de ônibus são casados com passageiras. Esses relacionamentos costumam começar nas longas viagens que, não raro, chegam a durar horas entre os bairros de uma cidade tão grande. Eu bem que conheço uma história parecida com essas, não em São Paulo, mas aqui mesmo em  Belo Horizonte. Todo dia, eu tenho que pegar um ônibus perto de casa, em Santa Efigênia, para ir para o trabalho, no Buritis, do outro lado da cidade. O percurso dura pouco menos de uma hora - isso quando o trânsito está bom. Numa das primeiras paradas, na rua Niquelina, todo dia e quase no mesmo horário, sobe uma moça. Deve estudar enfermagem, porque está sempre de branco e leva consigo uma bolsa que parece pesada pelos livros. Numa bolsa menor, tipo uma necessaire, ela leva, provavelmente, o almoço. O primeiro que a nota, antes de mim, é o cobrador (aqui em Belo Horizonte eles o chamam de "agente de bordo"). Mas ele é bem tímido, repara-se que ele baixa os olhos ao vê-la. Com os outros passageiros (e passageiras) ele também é bastante reservado. Agradece a todos, cumprimenta-os, entrega o troco, dá uma ou outra informação sobre o percurso, tudo em voz baixa, muito educada, muito gentil. O restante do tempo ele viaja calado, cuidando dos formulários da viagem, anotando os números da catraca, conferindo o dinheiro. Mas de vez em quando ele (ninguém percebe) olha de soslaio para a moça de branco, que vai geralmente sentada dois ou três bancos distante dele, isso quando dá pra ir sentada. Eu noto que ela percebe que está sendo observada, cortejada pelos olhos do cobrador. Sei também que ela deve ser tão tímida quanto o rapaz, porque lhe flagro um certo rubor na face, mas um brilho nos olhos que ela tenta disfarçar voltando às páginas dos livros de anatomia e de fisiologia humana. É assim todo dia da Niquelina até a Savassi, onde ela desembarca. Nem seria preciso dizer que o cobrador acompanha com o olhar a moça descer do coletivo, até que ela some no meio da multidão na rua. Eu fico imaginando porque esses dois não se resolvem de vez. Se é ele que tem que tomar uma atitude, amanhã ou depois ele podia, como faz com os outros passageiros, cumprimentá-la também, dizer bom-dia, boa viagem e "obrigado por viajar conosco" (é o que o pessoal de RH da empresa deve mandar os empregados dizerem), oferecer-se para levar a bolsa dela quando o ônibus estiver cheio. Daí, ele podia falar do calor, da chuva que não chove a meses, dos livros de anatomia e fisiologia humanas, contar a ela que uma tia distante sofre disso ou daquilo e perguntar à enfermeira - técnica de enfermagem, ela corrige - qual é o remédio. E, enquanto os dias passassem, até que ela se formasse no curso de enfermagem, os dois ficariam juntos - ele, talvez não mais cobrador ou agente de bordo, ela agora não mais subindo na Niquelina e descendo na Savassi, mas talvez com os dois filhos, um menino e uma menina, que se ficassem gripados, a mamãe saberia qual é o remédio. E, se precisassem ir a algum lugar, papai saberia qual o ônibus.

sábado, 15 de outubro de 2011

INTIMIDADE TÍMIDA



(É ela quem me olha de longe
Ou é o espelho que me revela?)

Primeiro ela:
vai me dizer e não me diz
fica como se o ar contasse
da coisa que existe entre ela e mim
O simples fato disfarçado
um dissimulado mal feito e mal fingido
Que poderia ser dito não fosse o acanhamento tímido:
Mas é um estranhamento feliz.
Ela já sabe e eu também contei pra mim
Que há alguma coisa a mais além de tudo isso.

domingo, 2 de outubro de 2011

MOMENTOS (CURTA METRAGEM)

Um homem sem teto, sem amor, sem esperança, sem futuro, sem passado...não, passado há, sim. E tudo o que amava pode estar prestes a voltar.

MOMENTOS (Portugal, 2010, 7 min). Direção por Nuno Rocha, para o Projeto LG "Life is Good". Com Rui Pena, Ana Ferreira, Débora Ribeiro.

PENNY (CURTA-METRAGEM)

Todo dia, na mesma hora, Penny senta-se num banco de praça em frente ao prédio onde trabalha para esperar o seu "amado" Josh. Todo dia, na mesma hora, Mick senta-se num banco de praça em frente ao prédio onde trabalha para esperar a sua "amada" Penny.

PENNY (Austrália, 2006, 15 min). Escrito e dirigido por Jonh King; com Holly Marshall (Penny), Luke Porter (Mick), Giovanni Bartuccio (Josh), Melanie Stevens (Lisa) e Lisa Fineberg (Tania)



sábado, 1 de outubro de 2011

PASSING HEARTS (CURTA-METRAGEM)

Daniel é um garoto normal para a idade: tem posteres do seus ídolos na parede do quarto, joga futebol, inventa que está doente quando tem preguiça de ir pra escola...a diferença é que Daniel vive com o coração de um doador. Um dia, ele recebe uma carta.

PASSING HEARTS (Suécia, 2006, 14 min). Direção por Johan Brisinger; com Kicki Bramberg (Mãe), Max Enderfors (Daniel),Angela Kovacs (Eva-Lena),Jan Mybrand (Lennart);

TRIP (CURTA- METRAGEM)

Tudo que um pai queria era passar um dia divertido com as filhas.

TRIP (Reino Unido, 2008, 15 min). Direção por Harry Wootliff; com Chloe Garner (Sabrina), Sam Hazeldine (Pai), Karis Igoe (Kim)




terça-feira, 27 de setembro de 2011

Comercial do Seguro Fiador da Porto Seguro. Muito engraçado! Acabei de ver na TV.

domingo, 25 de setembro de 2011

MEMORIES

Um homem encontra pedaços de negativos fotográficos na rua, a caminho de casa.

sábado, 24 de setembro de 2011

MARTIN E MARIANA

Tem uma cidade inteira entre a gente Milhões de estranhos nos escondendo
E não nos vemos
O que importa está a poucos segundos da vida entre mim e ti:
Tudo que temos que fazer é atravessar a parede que não é de verdade.
 Tem o que não precisa haver que nos impede
Tem o que não tem que ser que não nos conhece:
Só precisamos saber que eu sou teu e que você existe.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

ESQUECER O FUTURO

Não deixei de pensar nisso:
por um instante emudeci
o segundo em que durou o estranhamento
basta agora pra dizer tudo o que eu sinto
No momento em que
Conheci tudo o que tenho.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Sign Language

Ben está no seu último dia de trabalho como "board guy" que é aquela pessoa que fica nas ruas movimentadas de Londres segurando cartazes promocionais. Ele fala com orgulho da sua "profissão", considera-se alguém importante no cenário urbano. Todos os dias, ao chegar na esquina em que trabalha, na Oxford Street, Ben vê uma linda garota que distribui panfletos. Mas ele nunca teve coragem de se aproximar dela, embora pareça que ela o nota e espera dele alguma iniciativa. Quando o alarme do relógio soa, Ben percebe que está terminando o seu dia de trabalho, como todos os dias. Mas este é diferente porque é o último. Se tiver que ser agora, a última chance de tomar coragem para ao menos se despedir da "colega" é esta. É aí que os outros board guys entram no jogo para dar uma forcinha. No verso dos seus cartazes, está escrito "Adeus, Ben, vamos sentir sua falta" e "Antes de ir embora, fale com ela".

SIGN LANGUAGE,Grã- Bretanha, 2010, 5 min. Roteiro por Stephen Fellows; dirigido por Oscar Sharp. Elenco: Jethro Skinner (Ben), Laura Mugridge (Anya) e os board-guys Pat Kelman(Harry),Robert Waters(Alex),Tiernan Hanby(Chris)e Neal "Monkey" Stevens(Steve).

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Twittando e blogando e seguindo a canção...


Eu meio que abandonei o meu blog depois que "descobri" o Twitter, sob a influência de uma amiga entusiasta da rede social dos 140 caracteres. Confesso que de início eu tinha uma certa desconfiança a respeito do passarinho azul, achando (meio que preconceituosamente) que o Twitter só prestava para "celebridades" se promoverem, se exibirem, ou pra disseminar, na velocidade de um carro de fórmula um, as besteiras cometidas por essas mesmas celebridades. Mas a impressão se desfez quando vislumbrei as possibilidades dessa rede social: ao mesmo tempo que serve pra repercutir um monte de bobagens, um monte de idéias erradas, o Twitter, como tudo na Internet, pode ser usado para espalhar coisas boas. Com um leve toque, um suave cutucão, posso levar mneu interlocutor a lugares interessantes, posso compartilhar grandes idéias, posso levar ao conhecimento dos corações e mentes de todos os meus "seguidores" as coisas que eu tenho visto no mundo, o que acabo de conhecer ou de ficar sabendo, ou algo de que me lembrei. Imediatamente, na mesma velocidade do pensamento, logo todos (ou pelo menos os mais chegados) ficam sabendo. Vou ficar na dúvida agora se o assunto merece um tweet ou uma...blogada. Em todo caso, de uma forma ou de outra as pessoas mais queridas (isso te inclui) terão notícia de mim e do que eu estou aprontando por meio de uma dessas duas "caras virtuais" que eu tenho na Internet.

sábado, 6 de agosto de 2011

LOVE LANGUAGE

domingo, 31 de julho de 2011

END OF THE GAME

(apesar de Sara não ter gostado)

Ela esperou tanto que enfim
acabou
O que estava por vir, não veio
E o que era pra ser, não foi
Ele ficou rondando a palavra
Sem dizer porque
Até que disse algo
Sem sentido
Ou que era para ser entendido
ao avesso
No fim, ela cansou
E se rendeu ao silêncio.

A JANELA

Colaboração de Sara Dutra

Quando abro a janela te vejo
Quando fecho a janela te espero
Quando a janela vibra te encontro
Quando a janela aparece te respondo
Culpa da janela!

AQUELA PALAVRA

É o mínimo que eu posso dizer
Mas nessa palavra
uma palavra pode conter tudo
E ainda deixar algo a ser dito.
Fica a mercê de quem me entende
fazer sentido.

(sem título)

De lá pra cá
e daqui em diante
Ou seja: sempre.
Desde o início e muito antes
E bem depois de tudo.
Algo sem princípio e fim
como um círculo.

AMOR PLATÔNICO MODERNO

Hoje eu percebi,
pela primeira vez,
algo que você achou que saberia esconder
"Pela tela, pela janela"
Eu senti um leve tremor
Quando a palavra parou no meio da linha
E você desconversou
Agora eu entendi o que você queria dizer e
nunca diz
do outro lado da linha,
a carinha alegre dizia
que você não estava feliz.

NÃO POR ACASO

Foi tamanha a surpresa que eu já esperava
e não acreditava mais que viria
Suspeitava sim que seria
Sem certeza

Estava sempre lá e eu não sabia
se soubesse já teria encontrado
Sabendo que já me procurava
e tinha visto

Eis que então, pelo previsto
E não por acaso
Um de nós dois que não sou eu
fez o que tinha que ser feito:

juntou os atos e os efeitos.

O TEMPO EM SUSPENSÃO

Estive esperando pacientemente
aflito para falar
enquanto isso em silêncio
Pensando nisso
Fazendo algo para pra não pensar
sabendo que não daria certo
Estive parado correndo contra o tempo
prendendo o ar
Pra voltar a respirar com você
Você me disse que não ia demorar
Mas voltou tão devagar que
Se eu esperasse mais um dia
Finalmente aprenderia a esperar.

UM CERTO ACASO

Algo sobre alguém que você sabe quem é
tem que acontecer
Pelo que já é tende a ser o que se quer
e pode ser se eu quiser
e você corresponder.

TOLO AMOR

A princesa riu
e o bobo ficou feliz
Pensando que o riso dela
era porque ele era um belo princípe.

DOIS A UM

Um dia eu te ganho
E me perco
Um por um dos meus medos
Você vai me roubar
Qualquer hora me rendo
Pra te levar.

domingo, 17 de julho de 2011

VOCÊ ESTÁ SENDO FILMADA

"Sorria, você está sendo filmado". Diz uma pesquisa recente que cada pessoa pode ser filmada em média, 60 vezes por dia. Nas ruas, nos hipermercados, nas lojas, nos corredores da escola ou do local de trabalho, na portaria do seu prédio, no trânsito, tudo o que você está fazendo, suas atividades mais triviais, pode estar nesse momento sendo observado por um guarda de segurança uniformizado. Muitas pessoas acreditam que essa vigilância permanente de todos os nossos passos na vida cotidiana de uma grande metrópole significa invasão de privacidade, uma espécie de voyeurismo oficial. Por essas câmeras, tanto se pode flagrar um cliente de supermercado furtando uma lata de atum, como um casal em carícias mais íntimas num canto de uma calçada, ou um ladrão arrancando a bolsa de uma senhora, ou a placa de um veículo que acabou de avançar o semafóro. Ou seja: nada escapa às lentes, nada se pode fazer escondido, ou impunemente. No longa de estréia do argentino radicado no Uruguai, Adrián Biniez, "Gigante" (2009, Vencedor do Urso de Prata do Festival de Berlim), temos um tímido guarda de segurança chamado Jara (Jarita, para os colegas) que trabalha no turno da noite na sala de vigilância de um grande supermercado da capital uruguaia, Montevídeu. Nesse horário, a loja já está fechada e, em vez de clientes, os corredores são ocupados por um batalhão de faxineiras, carregadores e repositores de mercadorias. Jara é um cara grandalhão, forte e um pouco obeso, muito calado e sossegado, que curte rock pesado, mas sempre nos fones de ouvido. Mora sozinho, de vez em quando cuida do sobrinho, e nos finais de semana faz um bico em uma boate perto de casa, expulsando clientes mais exaltados, apartando brigas. Seu dia a dia é quase sempre esse: da casa pro trabalho e do trabalho para casa, dormindo na frente da TV e, às vezes, na frente dos monitores da salinha de controle. Um dia sua monótona rotina sofre uma reviravolta: pelos monitores de vídeo, Jara assiste o gerente do supermercado dando um pito em uma empregada da limpeza que, sem querer, derruba uma pilha de rolos de papel higiênico; dando um zoom na imagem, Jara percebe a expressão constrangida da faxineira, quase chorando, mãos trêmulas; mas no que Jara mais presta atenção é o lindo rosto da jovem. Essa imagem fica na sua cabeça e ele se apaixona nesse mesmo instante pela garota. O rapaz passa então a seguir todos os passos dela: descobre o seu nome, Julia, roubando a ficha de identificação dela no arquivo do RH; segue-a até em casa, na lan house, no cinema, na loja de conveniência, sem jamais aparecer ou se apresentar. No início desse texto, falamos na vigilância secreta das câmeras: o que Jara faz é a mesma coisa - vê sem ser visto, segue sem ser notado, conhece sem ser conhecido. Julia segue sempre alheia a esse "assédio secreto" do vigilante. Mesmo quando ela encontra com outros rapazes, no trabalho ou não, Jara está ali, bem perto, observando e registrando tudo, como se ele mesmo fosse uma câmera de vigilância.
Assista ao trailer

GIGANTE (Gigante, 2009,Uruguai/Argentina/Alemanha-Espanha, 90 min; Direção Adrián Biniez; com Horacio Camandulle e Leonor Svarcas)

quinta-feira, 14 de julho de 2011

MICHAEL BUBLE: "LOST"

Confesso: chorei assistindo a esse clipe. O filme da canção "Lost" do álbum "Call Me Irresponsible" do cantor americano Michael Buble. O que temos são várias pessoas que moram no mesmo prédio e suas histórias de solidão e perdas: o senhor idoso sozinho em sua sala de jantar, com a mesa posta para duas pessoas; o rapaz que ficou paraplégico contempla desencantado as medalhas que ganhou quando ainda era um grande esportista; a mãe que acaricia o retrato do filho (parece que ele já morreu), o rapazinho que chora de saudade da garota amada, a mulher de camisola aos prantos, sentada no chão frio do banheiro. Mas a canção nos diz que você nunca está só. Talvez, se você sair do seu mundo, se você abrir a porta e olhar pela janela, quem sabe não encontra alguém? Alguém pode estar te procurando também.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

AOS QUE VÃO FICAR: MINHA VIDA SEM MIM

Em Minha Vida Sem Mim (My Life Without Me, Canadá/ Espanha, 2003, dirigido por Isabel Coixet e com produção de Pedro Almodóvar), Ann (Sarah Polley) descobre que vai morrer daqui a dois, talvez três meses, mas só ela (e o médico) é que ficam sabendo disso. Para o marido e as duas filhas, para a mãe, para as colegas de trabalho, Ann tem apenas uma simples anemia. Na realidade, o câncer nos ovários já se alastrou para o pâncreas e os rins. Mas não é por medo ou covardia que Ann esconde das pessoas queridas que vai morrer. Mesmo quando ela recebe o diagnóstico, não se descabela, não se desespera, sequer verte uma lágrima. Ann só tem vinte e três anos, e a vida não tem sido generosa com ela: trabalha à noite varrendo os corredores da universidade em que sempre sonhou estudar; A mãe (Debbie Harry, vocalista da banda Blondie), amargurada e fria, quase não fala com ela, e quando fala destila seu rancor e sua mágoa contra tudo e contra todos. Ann também não fala com seu pai, há dez anos preso. A felicidade de Ann são as duas filhas, Penny (Jessica Amlee) e Patsy (Kenya Jo Kennedy), e o amoroso e dedicado marido Don (Scott Speedman), que constrói piscinas, mas há meses está desempregado. A família mora num trailer no quintal da casa da mãe dela e é, para todas as aparências, unida e feliz. Quando descobre a iminência da morte, Ann toma para si mesma grandes resoluções: vai usar todo o pouco tempo que lhe resta para preparar as pessoas que ama para o dia em que vier a faltar. Assim, ela anota em um caderno a lista das dez coisas a fazer antes de morrer. As "tarefas" incluem, entre outras providências, registrar em fitas cassete mensagens para os aniversários das filhas até que elas completem dezoito anos, encontrar uma nova mulher para o marido, e experimentar um outro relacionamento só para ver como é, já que Don fora seu primeiro e único homem. O amante surge na figura de um estranho chamado Lee, que mora em um apartamento sem móveis (Mark Ruffalo, em brilhante atuação). Assim, serenamente, mantendo a rotina enquanto consegue manter-se de pé, Ann vai se despedindo sutilmente do mundo, sem alarme e sem alarde.Graças à direção segura e econômica de Isabel Coixet, Minha Vida Sem Mim não descamba para a pieguice, nem procura dar lições de vida e de moral, nem apresenta a morte como um drama lacrimoso, grotesco ou chocante: sequer se dá enfâse a degradação física provocada pela doença. A cena em que ela, literalmente, desaparece, é apenas um fotograma branco no filme. Assista o trailer.

AMOR CONTRA AS BALAS

Em meio a uma saraivada de tiros, um casal se beija apaixonadamente. Este é o roteiro de belíssimo videoclipe da canção "21 Guns", da banda de punk rock californiana Green Day, single de estréia do mais recente álbum do trio, 21th Century Breakdown. "21 guns" é a salva de vinte e um tiros que são disparados em alguma ocasião festiva, ou em homenagem a alguma autoridade. No caso do clipe dirigido por Marc Webb, de "500 Dias Com Ela" e da nova série de filmes do Homem Aranha, temos um casal acuado na sala do próprio apartamento, na minha opinião uma metáfora do estado atual de sua relação. O rapaz e a moça olham para lados opostos, ela para a janela onde oscila a perigosa luz de uma viatura policial e ele para lugar nenhum, parecendo alheio a tudo em volta. Os dois não se notam, parece que um dos dois não está ali. De repente, o que era uma ameaça se torna real: uma rajada de balas começa a ser disparada pela polícia. Em meio ao desespero e ao pânico, os dois se entreolham e descobrem que estão juntos e, seja o que for, precisam um do outro. O que quer que aconteça será com os dois e nos piores momentos da vida ou nas horas mais felizes ambos serão protagonistas da mesma história. O belo paradoxo do filme é que os tiros disparados pela polícia abrem buracos nas paredes fazendo com que a luz exterior invada o ambiente, iluminando o antes obscuro apartamento, revelando os objetos outrora ocultos pela penumbra. A luz que faltava para que um pudesse ver o outro, para enxergar nele um espelho de si mesmo. Agora, com o dia claro entrando pelos buracos de bala, eles podem ver que ambos precisam confiar um no outro, entregar-se, encarar a realidade e enfrentá-la juntos, aconteça o que acontecer. Mesmo em meio aos tiros, da saraivada de problemas, apesar de todo o caos, os dois caminham um na direção do outro, se abraçam e se beijam, como se esse beijo fosse o selo de algo que existe para o que der e vier, e mesmo que possam morrer, morrerão juntos, em nome de alguma coisa muito mais importante do que tudo.
Assista:

terça-feira, 12 de julho de 2011

(sem título)

Mudam as consequências de novas razões
A mesma ideia é dita de outra maneira
E contém sentidos iguais

De outras aparências o ser se apresenta
De modo a se reconhecer

Estranha coincidência isso nos fazer lembrar
que a mais recente novidade
É a muito tempo conhecida.

SAVASSI MAIS BELA

A moça recatada e trabalhadeira de dia
Torna-se a dama da noite
Com as luzes acesas

A mesma que de dia é feia, mal-vestida, uniformizada
Dança com estranhos até a hora mais tardia da madrugada

Ar de criança crescida no início da tarde
Lojas de brinquedo abertas
E roupas novas coloridas
Quando a noite cai, a moça sóbria, sombria e contida
Desvaria:
Depois de tudo vai dormir cansada.

(e o vermelho do batom torna-se cinza)

domingo, 10 de julho de 2011

PRIMEIRO DOMINGO DE JULHO

Já que essa tarde de domingo não foi como eu esperava, e nem COM QUEM eu esperava estar, preciso fazer novos planos: estou aqui mesmo, e tem uma galeria de arte, uma cafeteria, um cinema. A livraria, disse o segurança, só reabre na terça. Dou uma olhada nas sinopses dos filmes. Interesso-me pela história de um homem de 70 anos, aposentado, que decide voltar a estudar na Faculdade de Literatura. O ingresso, por incrível que pareça, custa só cinco reais, a inteira. Lá em cima (estou no nível inferior do Palácio das Artes), a galeria exibe uma exposição que cobre 100 anos de arte brasileira: perambulo pelos artistas da década de 10 do século passado até obras dos dias atuais. Quase seis da tarde, desço, tomo um belo cappucino na cafeteria do Palácio e vou assistir ao filme. Emociono-me com a história de Chano, um simpático septuagenário que acaba de se matricular na universidade. O filme termina, saio do cinema com a alma mais leve, e um pouco menos triste. Resolvo caminhar pela linda cidade que é Belo Horizonte num domingo à noite. Nem parece aquela capital agitada e nervosa de segunda a sábado. Vou andando até a praça diante do Batalhão da Polícia, onde as crianças brincam, os casais de namorados (homos e heteros) passeiam de mãos enlaçadas, as senhoras conduzindo seus cãezinhos, garotas saradas fazendo sua caminhada, o vendedor de pipoca com o seu ganha-pão. E o trânsito tranquilo, a temperatura amena, quase me convidam a permanecer ali por mais tempo, pensando na vida, me convencendo que eu tenho o direito de ficar assim em paz comigo, consciente do que eu sinto, até mesmo para ter saudade e vontade de ver, de conversar, de me apaixonar de novo. Vou até o Shopping Center ali perto, entro só para ficar perambulando, olhando as vitrines das lojas fechadas, a exposição de carros antigos, a fila do cinema, que está passando um blockbuster qualquer. No hipermercado, compro lápis, canetas e cadernos, compro um refrigerante. Saio para procurar o ponto de ônibus para casa. As pessoas, com ar de cansaço feliz, o dia delas deve ter sido divertido também, todas elas saíram da rotina dos dias comuns. A não ser a bela garota com o uniforme da empresa que gerencia o cinema do shopping: ela acaba de deixar o serviço, não deve nem estar pensando em lazer, em ver um filme. Deve estar aflita pra chegar em casa. O telefone toca, e a mensagem de texto diz que vale a pena viver o momento, "curtir a própria companhia", que foi bom não ter desperdiçado a tarde de domingo. Concordo. Sim, estar comigo mesmo hoje foi bom, acho que agora eu gosto um pouco mais de mim, embora o coração esteja ainda um pouco triste.

sábado, 9 de julho de 2011

EMPREGO

Um curta engraçadíssimo sobre como é difícil arrumar emprego hoje em dia.

domingo, 3 de julho de 2011

SINAL FECHADO; SORRISO ABERTO

Filme da Brastemp: "O Dia em que um Sorriso Mudou São Paulo"

sábado, 11 de junho de 2011

O ROLO DO NOVELO

Mil voltas teremos até o começo
Quando o fim do caminho chegar ao destino
Quando cavar o fundo do abismo para ver o ouro escondido no meio
O fio do tempo vai levar ao segredo
que está ocultado pelo dia claro
Quando for revelado, já será conhecido
Porque foi sempre suspeito.
Mil enredos imagino para este romance de mistério:
acho que vou estudar teatro.

A MENTE INQUIETA

Para M.

Eu, se você deixasse, te daria o sono sem química
O sábio cansaço de um dia corrido
Depois de horas de boas risadas, entre amigos comuns e boa comida

Se você quisesse, eu ouviria por horas suas fantasias,
seus medos, fantasmas, suas mais loucas idéias
E depois de tudo isso te acalmaria

Traria o livro que fala de você sem te conhecer, o
filme que vimos a tempos para rever, uma canção de amor
que é exatamente sobre isso

Eu até te ajudaria a consertar o mundo
Iria até o fim se fosse preciso
Carregaria as ferramentas mais pesadas

Eu faria isso tudo por você
Se você me deixasse falar,
- E não fosse embora tão cedo.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

terça-feira, 7 de junho de 2011

DA CIÊNCIA DE TI

Sou cético quanto às evidências
Porque elas não me deixam margens
Para o cartesiano exercício da dúvida
Se são óbvias demais as circunstâncias
Fica a incerteza
Se não são provas forjadas pela imaginação.

A IMAGEM INVERTIDA

Você sou eu ao contrário:
Mas como te vejo no meu espelho, o que se vê é perfeito
Você vive do lado oposto do meu desejo
Mas como vives dentro do meu sonho
o que desejo é sonhar
Eu sou você em tudo o que sinto
Mas o que sinto é a falta do que não tenho.

A DESCONHECIDA ÍNTIMA

a P.

De repente o Céu não era este pintado em um quadro renascentista
E o luar era apenas a luz do sol noturno
Caí na real: a musa do poeta medieval era uma mulher apenas
Não era o sonho diurno do homem comum
Mas uma dentre todas da cidade que não é parecida com nenhuma outra desconhecida
E é original por ser apenas ela
Sem arroubos, sem fetiches, sem novelas
Simples e sincera
Sem pintura
Isenta de artifícios
E indiretas.

domingo, 29 de maio de 2011

FRAGMENTOS DE VELHOS CADERNOS ENCONTRADOS NO FUNDO DA GAVETA

CONGESTIONAMENTO

Há um vídeo belíssimo da canção "Everybody Hurts" ,do grupo americano R.E.M. (assista aqui) que flagra o momento em que o trânsito de uma grande rodovia está completamente congestionado; a câmera, como um voyeur, passeia lentamente por dentro dos carros, observando delicadamente as relações de cada pessoa que está dentro dos veículos com aquele instante em que é obrigada a parar e pensar. Na "vida corrida" das grandes cidades, é na hora do congestionamento que a metrópole revela mais descaradamente o que é, um amontoado desigual e incoerente de experiências humanas, todas elas em busca de algo que está lá adiante, por isso distante do lugar em que estamos, sempre a justificar os nossos deslocamentos cotidianos. Então, por uma lógica esquizofrênica, por um conjunção atrapalhada de fatores adversos, eis que a ordem de passagem dos veículos pela via expressa se subverte: todos querem chegar ao mesmo destino ao mesmo tempo mas ninguém sai do lugar. Eu mesmo só queria ir para casa depois de um dia de trabalho, que trata justamente disso: a relação conturbada dos condutores com seus direitos e deveres, quando o descumprimento da norma coletiva submete os infratores às penas pecuniárias impostas pelo Estado. Mas está tudo parado; são seis horas da tarde de uma segunda-feira qualquer, comum é nesse horário demorar muito mais para percorrer um espaço cada vez menor. Tanta gente disputando um mesmo direito de ir e vir, negociando ou pelejando pela vida; dois milhões e meio de desconhecidos, cada um dos quais por si, às vezes encontrando e desencontrando um semelhante no caminho, mas sempre o perdendo na distância, na exigência da velocidade, na pressa pelo destino, que nos leva inexoravelmente para o fim e o termo de todas as coisas. Enquanto vivemos, queremos tudo e tudo de imediato. Por isso, um segundo a mais torna a viagem mais cansativa, como é de cansaço o olhar daquelas pessoas que se acotovelam nos pontos de ônibus e dentro deles, como é de aborrecimento a expressão dos que estão ilhados no interior das suas máquinas potentes individuais, inúteis diante da quase total impossibilidade de seguir em frente. Eu contemplo absorto a fila de olhos vermelhos à minha frente, as luzes de freio que alertam para o fato de que lá adiante há uma situação de perigo, e é então perigoso ir em frente, ninguém sabe o que será, mas todos estão indo para lá. A maioria de todos já se acostumou ao cotidiano congestionamento. Mesmo que reclamemos do poder público, mesmo que extravasemos nossa indignação com sonoros palavrões dirigidos ao motorista ao lado, ao agente de trânsito - bode expiatório da completa falta de organização que os próprios carros provocam - nós não fazemos mais nada, apenas nos submetemos, apenas nos conformamos em chegar mais tarde em casa, em perder o primeiro horário, em deixar as pessoas queridas nos esperando na porta do teatro. Para o tempo passar (o tempo não passa) alguns se refugiam num bom livro, outros na animada conversa da turma do colégio; casais de namorados torcem para encontrar dois lugares vagos lado a lado, e a dona de casa com suas sacolas de compras se esforça para arranjar-se no banco apertado. Um estudante (com certeza o que vai perder o primeiro horário) tenta uma revisão às pressas do conteúdo da prova do segundo horário; a menina de jeans e camiseta de "boys band" e piercing no nariz ouve no fone de ouvido do ipod um som tão alto que dá pra ouvir mesmo com o burburinho das pessoas; um senhor calvo de óculos ressona levemente, teve sorte em encontrar uma boa alma que lhe cedeu o lugar reservado para idosos, quase sempre ocupado por um adolescente egoísta e arrogante. Daqui, a dois bancos a frente, vejo uma linda garota que de vez em quando percebe que estou olhando para ela e volta-se para a leitura de um tratado de filosofia; observo seus óculos de aros grossos de cor vermelha, suas roupas sem griffe mas com estilo; alguém lê uma notícia de jornal: mais um crime, mais uma lei que o governo decretou, mais um escândalo envolvendo alguém do primeiro escalão, mais uma criança recém-nascida abandonada num lixão. E o trânsito que não anda, o paradoxo em desenvolvimento, as vias arteriais da cidade estagnadas, estranguladas pelo excesso de "movimento". As leis da Física dizem que a menor distância entre dois pontos é uma reta. Mas na prática, na vida cotidiana, é mais fácil procurar um caminho mais longo que seguir pelo caminho mais fácil.


ALGO DO CORAÇÃO DA RUA

para Belo Horizonte

Ando por teu passado, cidade
E é freqüente no pensamento uma lembrança
de hoje ou de antigamente
Que envolve algum de teus caminhos
Se não me cuido, chego a me perder
De ir procurar alguma coisa que deixei ficar
em certos lugares em ti
Minha cidade, tens algo de mim em tuas ruas
Meu coração vaga por entre os edifícios
indo buscar em teu infinito movimento
não necessariamente em direção ao futuro
uma razão para rever o que já não me lembrava de ter visto.

(...)

O REAL É A IMAGINAÇÃO SEM IMAGINAÇÃO

Que triste não saber sonhar
Apenas ficar alerta o tempo inteiro
Contra tudo o que não é verdadeiro
com medo de um pensamento roubar a idéia.

TENTATIVA DE EXPLICAÇÃO PARA O QUE NÃO FAZ SENTIDO

Saio-me bem em metáforas: explico tudo o que sinto por indiretas que tocam o coração. Meu alvo em movimento foge mas eu o persigo, e o surpreendo se escondendo de mim em mim mesmo. Digo o que sei com as palavras que tenho, pouco em comparação com o que não digo, que é a maior parte do discurso inteiro.

(...)

Um código secreto:
Tão secreto que só eu interpreto
Algo de que você nem desconfia
De tão desatenta que tem andado
Marquei o caminho com sinais trocados
Que te confundiram
Levando-te exatamente ao extremo oposto
da tua vontade.

1h35

Esvazio o dia já vazio
quando chego em casa;
hoje de manhã o caminhão de lixo passa
e levará o bilhete, o convite e a carta
Mato a fome, o sono e o desejo
vejo as últimas notícias de ontem à tarde
quando eu ainda não sabia de nada
Depois volto ao meu quarto, a ver miragens nas paredes
e luzes acesas nas janelas da casa ao lado
Houve um excesso de esperança, e destempero
Quase deu tudo errado
Foi um turbilhão o olhar furtivo dela

Mas há os livros ou um filme
para o caso de uma noite em claro.

(...)

Mesmo sem querer
Pense em mim
por favor

Entre seus livros de estudo
haverá um vulto do amor.

(...)
Ficou de pensar
se viria
Mas não respondeu
Prometeu lembrar de mim
Mas me esqueceu
E eu, que não fiz nada
fiquei só com as palavras.

(...)

CAOS URBANO

Eu não te acho no mundo pequeno
Mesmo que ande muito rápido
Eu te acordo com meu chamado
Mas não te entendo do outro lado:
não ouço nada do que você está dizendo
Chego sempre atrasado atrás do passado
que vou perdendo
E não te encontro no lugar marcado
pelo caminho errado
que estou vivendo.

(páro a rua/porque preciso correr para te achar/eu quero te encontrar na confusão/em que lugar dessa cidade você está: naquele edifício que nasce do chão, no meu pensamento/ou naquele carro que foge do passado?/Quem é você no meio da multidão/uma em um milhão num congestionamento?)

(...)


CANÇÃO DE NINAR GENTE GRANDE

Não faça barulho ao fugir
Vá embora em segredo
Me espera dormir primeiro
Retire-se de mim com cuidado
Leve tudo o que você quiser
Ou não puder deixar
Desfaça-se de mim de mansinho
Com palavras e gestos gentis

Mas não saia tarde demais
E nem se demore
Ande depressa ao sair
Antes de se arrepender.

AUTO CENSURA

Fique calado e páre de sonhar
Esqueça
Eu sei muito bem que tens medo
Mas sei também que demonstrar medo é fraqueza
Percebi o teu ciúme, vi quando você chorou
Ouvi que você contou o segredo
Mas vou te poupar do constrangimento público
Vá para casa, páre de falar, não beba
Fique quieto no seu canto que é o melhor lugar
E, por fim, escuta esse conselho
Não acredite em mais ninguém: nem em si mesmo.



(...)

Ela me diz que deixa de saber
e não tem porque ligar
Não tem que me ver
se eu for, ela não vai
E se eu insistir ela pode não atender
Ocupada demais em me esquecer.

(...)

Clichê original

São iguais às histórias de amor:
Todas parecem filmes
Duas horas depois ficam na memória.


(...)

estou voltando daquela noite
Já sonhamos alto
Você tinha que ir
E eu não tinha
de modo que fiquei mais um pouco por lá
Meu corpo precisava descansar
O coração podia continuar
Venho para casa e este livro
se cala
Dizendo que talvez seja melhor pensar
do que prestar atenção nas palavras

(...)

Inventei uma história
Que eu acho que é verdadeira
Nela você não existe:
é apenas uma ilusão
Eu quis te fazer do meu jeito
Meio irreal
No meu plano eu me rendia e você ganhava no final.

(...)

O Coração da Rua

Ando páginas atrás no tempo
no lugar em que existe o pensamento
O caminho exato de muito tempo antes
Quando eu ia e sabia seguir
Sinais teus pelo deserto
Habitado de inúmeros seres estranhos
Selva, cidade
Ruas e ruas
Torres de vidro, aço e concreto
Presas armadilhas
Caos urbanos
Milhões de olhares amarelos
Ecos de tudo
amor, paredes, esquecimento
Bastou-me sair à rua
para voltar o tempo.

(...)

O hábito me ensina
a compreender a falta
Questão de saber deixar o tempo
Fazer o necessário com o esquecimento
Acostumar-me com o cotidiano ermo
Até que, por si só, chegue a seu termo
Apagando seus sinais ao longo do caminho.

(...)

O CÉU DOS CIENTISTAS

Algo em tudo é mero acaso
Parte do todo é meio vago
Pouco se sabe sobre o resto.

O ERRO DE EROS

Quem te falou, que isto que
sobressai no corpo
É amor?
O desejo de fato é o pai do destino
Foi ele quem criou o tempo
e de acaso se disfarçou
Como um monstro suave
de olhos negros.

(...)

Vou inventar que te esqueço
Para não ter que te contar porque não consigo
E disfarçar um sorriso de tal jeito
Que não se perceberá que estou sofrendo.

(...)

O DIA DA CAÇA

Querendo sem querer
Laçado por não se proteger
Preso pelo prazer
de ser vencido
Enganado para ser acolhido e alimentado.

(...)

Também o contrário do que eu sinto
me passa pela cabeça
e contesta a minha razão
São mil os motivos do não
Mas apenas de uma coisa eu tenho certeza
a dúvida que há no meu coração
Põe pontos de interrogação
nas palavras.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

ESSAS MULHERES

Sherazade me enganou
Fazendo-se passar por Ariadne:
O fio era, na verdade,
Corrente

ESTA É A CIDADE

Um senhor anda apressado, trajando terno escuro e com a pasta executiva, provavelmente está atrasado para alguma reunião; a moça de branco vai daqui a pouco aprender mais alguma coisa sobre os ossos do corpo humano; o homem de amarelo e azul olha o envelope colorido e procura nas fachadas dos edifícios o número do destinatário; o rapaz de uniforme apita estridente e agita freneticamente os braços, apressando o movimento dos carros; a mãe ralha com o menino que teima em olhar para a vitrine da loja de brinquedos; ela tem pressa, pode perder o ônibus, e o outro só daqui a sei lá quanto tempo; um rapaz de banho tomado e camisa nova olha para a direita e para a esquerda, espera alguém que já se demora, parece; deve ser uma mulher, talvez um outro rapaz; ele olha para o relógio e franze a testa; um menino esfarrapado e sujo, o nariz escorrendo, estende a mão pequenina e com sua pequenina voz pede uma moeda, mas na verdade o que ele quer mesmo talvez seja um pouco de carinho e de atenção. Esta é a cidade. Casais de namorados de mãos dadas perambulam bobos pelo parque, naquele doce alheamento sobre o futuro de sua relação, quando a tendência é mais dia menos dia tudo terminar numa tola discussão na porta do cinema sobre que-filme-vamos-ver; uma senhorinha de uniforme laranja arrasta a vassoura de piaçava pela calçada, no mesmo instante em que uma garota de óculos escuros, i-pod e tênis all-star acaba de lançar o papel do chicletes que masca displicente; um carro importado sem cerimônia estaciona na faixa de pedestre; a dona de bengala e bíblia olha conformada a rua por onde então terá que passar, isso se os sacos de lixo deixarem; um mendigo parado com uma expressão abobalhada, diante do cartaz de uma seminua musa de cerveja; um operário abraça a namorada num canto escuro da calçada; uma melodia tristonha sai do rádio de um cego que pede esmola e um menino oferece, numa bandeja de doces, o sabor da vida. Enquanto isso, os cartazes anunciam a felicidade a preços populares para o rebanho triste que anda em fila indo para casa. Esta é a cidade. Uma sirene pede passagem ao tráfego intenso; alguém está morrendo nesse instante atado aos tubos de oxigênio ou ao aparelho desfibrilador. Na outra esquina, alguma criança com corpo de moça vende a ilusão de um amor que não sente, de um prazer que nunca experimentou a quem tem pouco dinheiro para comprá-lo. Esta é a cidade.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

DA RUA AMIANTO

Sinceramente, essa arquitetura não me interessa mais
Essa pintura antiga das fachadas não faz mais diferença
A novidade de tudo nessa cidade é algo que mais me atrai
Eu vi ouro e prata em outros tempos
E grandes senhores de quem fui rei
Mas essa noite fui sem saber o mais pobre dos homens
Diante da dona do meu país
Pelas ruas de pedra eu deixei passar os instantes
Quase sem acreditar no que vi
Como se fosse realmente real e não um teatro como a vida
que eu sempre li
Para o bem da verdade, essas histórias da fantasia
Não me dizem nada mais e é
Melhor ver do que sentir
- que o sonho só existe quando não se vive.

domingo, 22 de maio de 2011

ONZE E MEIA

Vai para casa então
E lá se deite
para perder o sono
Lembre-se do que eu disse essa noite
E nunca mais se esqueça
Ligo amanhã
quando acordar.

A LINGUAGEM DAS MÃOS

Olho mais para suas mãos do que em seus olhos
Porque aquelas mais que estes desenham estrelas e caminhos
Criam idéias, ilusões
Mas eu imagino
Que contornos teriam na ausência da visão.

Vejo mais claro pelo gesto que pela explicação
Que um só deles contém tudo o que é preciso:
Se fosse dito teria menos sentido.

O SEGUNDO SINAL

Já fui lá fora mais de não sei quantas vezes. Olhei a rua de um lado e de outro, e mais de uma vez vi uma garota morena de cabelos curtos, de vestido indiano e bolsa de crochê. Mas não era você. O relógio está marcando 20:55, e o espetáculo do Galpão está marcado para as 21. Estamos no horário de verão. Começou hoje. Adiantar o relógio em uma hora. Tanto que quando eram seis da tarde - a hora em que eu cheguei aqui - ainda estava dia claro. Cheguei tão cedo porque queria ser o primeiro a chegar, os lugares não estão marcados, e eu ia ficar de plantão na porta do teatro para pegar a primeira, no máximo a segunda fila. Gosto de ficar bem perto do palco, ouvir o ruído dos passos dos atores sobre o piso de madeira, notar detalhes mínimos do espetáculo, prestar atenção em tudo. E o mais ainda era ter a expectativa de ver você aparecer lá longe na rua, vir se aproximando de mim, me reconhecer no meio do povo, como se estivesse ali só por minha causa. Você iria me dar um abraço, um beijo no rosto. Então nós iríamos nos atualizar sobre nossas novidades, você iria me contar sobre as agruras de se formar, sobre os problemas na sua casa, sobre os amigos comuns que sumiram, sobre o que você anda lendo. Eu ia falar sobre a chatice do meu emprego, sobre a minha filha, sobre eu ter mudado de casa outra vez em menos de um ano. Enquanto esperássemos pelo início da peça, tomaríamos uma xícara de capuccino na cafeteria do teatro -está fazendo frio - e ficaríamos zapeando as prateleiras da livraria. Mas já são 21h, o primeiro sinal já tocou, e você que não chega. Passa pela minha cabeça, e aperta o meu coração, a possibilidade de você não vir, me dar um "bolo" como daquela vez ano passado. Depois você se justificou dizendo que era por "coisas de mulher", essas coisas de todo mês. Eu disse que tinha entendido, que "tudo bem", mas assisti o espetáculo sozinho, com um gosto amargo na boca; fiquei um tempo triste e aborrecido, mas depois que você apareceu lá na faculdade - como se não tivesse desaparecido - e eu esqueci tudo no mesmo instante em que te vi de novo. 21:02. A platéia lotada já, casais juntos, famílias inteiras na mesma fila, todos ansiosos e alegres, bem arrumados para a ocasião. E eu na porta do teatro ainda, olhando para a esquerda e para a direita, vendo você em todas as moças que passam, mas nenhuma delas é você. Nem precisa mais da bolsa de crochê, nem do vestido indiano, nem dos cabelos curtos. Não precisa nem mesmo ser morena, confundo todas com aquela a quem espero ansiosamente, a única que me interessa em toda a cidade. A única que eu amo. 21:05. Segundo sinal. Ah, não, de novo, não!
Então, de repente, lá no Mercado das Flores, uns cento e tantos metros de onde eu estou, aponta uma garota de vestido indiano, cabelos curtos e bolsa de crochê. Morena. É ela! Em cima da hora! Os passos apressados dizem que ela está ansiosa também, que veio quase correndo pelas ruas desde o ponto em que ela desceu do ônibus dela. Quando me vê, aflito, sorri: "Desculpa. Esqueci do horário de verão".

sábado, 21 de maio de 2011

A IDÉIA DO FIM

No plano e no espaço onde penso que existo,
Apenas um ponto infinitesimal e finito
diz que sou algo menor do que realmente me sinto
e que um dia qualquer não serei nem isso
Nem haverá de mim qualquer sinal.

QUASE O TEMPO

Eu e você não nos encontraremos
por muito tempo
Depois de hoje quem sabe
Se haverá outro acaso
Numa cidade tão grande

Nessa noite conversaremos
por muitas horas
sobre a saudade.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

A OUTRA FACE

Me apego ao que me foge
e a dor que sinto me cai bem
vigio o algoz para que ele me alcance
E faça o mal que prometeu
É isso ou a solidão
Que causa medo.

NÃO PODEM SABER

(Para Grissom e Sara)

Se eu me surpreendesse
Não seria surpresa
Pois suspeito o que viria a ser
Embora eu não tenha a menor idéia do que me espera

Me acostumei a não crer
Tendo esperança
E a te querer abrindo mão de ti
Discretamente te assediando a distância.

ESTRANHOS ÍNTIMOS

Acabou o resto de amor
Um pedaço que nenhum dos dois guardou
Achando que daria
Um de nós roubou a melhor parte do que a gente seria
E eu diria que esse alguém era eu
Mas não digo
A gente pensava cada um por si
Sem saber o que o outro queria
Achando que era igual

MERO ACASO

É quase certo que hoje não será:
Mas eu espero.

INDISCRIÇÃO ALHEIA

Pelo meu silêncio já se vê
que eu queria dizer o que não digo:
Qualquer olhar desatento
já saberia o meu segredo.

terça-feira, 29 de março de 2011

AMOR NÃO TEM PREÇO

Recompensa de R$ 1.000 é oferecida para quem achar cão de morador de rua
O cachorro Neguinho sumiu quando Renato foi levado para um abrigo da prefeitura

Do R7, com Rede Record

Uma recompensa de R$ 1.000 é oferecida para quem encontrar o cachorro de um morador de rua na zona sul do Rio de Janeiro. O cão atende pelo nome de Neguinho. Renato, que vive numa praça em Ipanema, foi levado à força por uma equipe da prefeitura para um abrigo. Para não perder o melhor amigo, ele deixou o cão amarrado a uma grade, mas quando voltou, poucas horas depois, o animal não estava mais lá.

Uma moradora, que se solidarizou com o drama de Renato, decidiu ajudá-lo, mandou confeccionar os cartazes e prometeu ajudar com parte da recompensa de R$ 1.000.

- O Renato pegou o Neguinho com quatro meses. Então é um pai e um filho, uma relação muito bonita com o animal que é o nosso amigo mais fiel mesmo.

Quando voltou à praça, Renato soube que duas mulheres pensaram que o cãozinho estava abandonado. Elas chegaram a comprar ração e uma coleira nova para Neguinho e levaram ele.

Renato, que conseguiu um emprego e uma casa para morar, diz que ainda não deixou a praça com medo de o animal voltar.

- Já tinha perdido a minha família, tudo que eu tinha o governo já tirou e agora me tiraram a única coisa que era um apoio de vida, que fazia eu me sentir vivo, me sentir alguém. Oportunidade para subir na vida eu já ganhei, já está quase tudo pronto, mas se eu estou demorando a ir, é por causa do meu cachorro, sem ele eu não consigo.

domingo, 27 de março de 2011

quarta-feira, 23 de março de 2011

É BOM VIVER (2)

sábado, 19 de março de 2011

QUEM, COMO, ONDE, PORQUÊ?



Uma análise de CSI Las Vegas – Investigação Criminal.



"Se você quer pegar um rato, aja como um rato, e não como um gato". A frase dita pelo perito forense Gil Grissom (William Petersen), supervisor do turno da noite do Departamento de Criminalística da Polícia de Las Vegas serve bem para resumir o que um grupo de técnicos munido de sua parafernália tecnológica fazem para chegar às respostas das quatro questões propostas pelo título desse artigo: quem fez o quê, como conseguiu fazê-lo, em que lugar o fato concreto se deu, e que motivações – abertas ou ocultas – estavam em jogo no momento crucial do ato. Entender o criminoso – diz Grissom – é pensar como ele, é compreendê-lo até, e é interpretar seus sentimentos e motivos; antes mesmo de realizar o pré-julgamento moral que somos tentados a fazer diante de um criminoso, nós, "cidadãos de bem", deveríamos nos ater aos fatos concretos, entendê-los, saber como chegou o ponto em que alguém, em sua sã consciência, foi levado a cometer um ato lesivo à vida ou ao patrimônio de um semelhante. E chegar a estas respostas depende não só do emprego de meios fornecidos pela ciência e pela tecnologia, mas exige método, muita intuição, esforço, coragem, um pouco de sorte e uma boa dose de paciência.
Tudo começa no grande teatro de operações chamado "a cena do crime" ( é por isso que a série se chama Crime Scene Investigation). O local e seu perímetro é exaustivamente esquadrinhado, dissecado,fotografado, escaneado por engenhocas sofisticadas ou pelos olhos experientes, perspicazes e bem treinados dos CSI’s, que é como esses peritos forenses são chamados. Tudo para ver com os olhos do suspeito e da vítima, enxergar o que estes viram na hora do crime, colocar-se no lugar dos personagens da ação. Não se trata, porém, de voltar no tempo – algo fisicamente impossível, como observaria Grissom - mas de tornar a vivê-lo como no instante em que ele se deu e, de preferência, no lugar exato. Daí, cabe aos CSI’s colher em campo cada fiapo de informação que o local do crime pode fornecer para recontar a história, cada pedacinho de cada pequeno detalhe tem que ser cuidadosamente recolhido e etiquetado, classificado pela sua importância no contexto. Um caco de vidro, um toco de cigarro, um fio de cabelo, uma goma de mascar, um bilhete, uma carta, fluidos corporais no lençol da cama – sangue, suor, sêmen – podem indicar quem estava ali, e quando, e com quem, e sabe se lá fazendo o quê, até que o desenrolar dos fatos resultasse em homicídio, suicídio, furto, incêndio, faces do mal materializadas pela ação ou a omissão de um ser humano, contra si ou seus
semelhantes. Cabe a eles repetir os passos da vítima e do seu algoz, ouvir o diálogo que aconteceu então, reproduzir os gritos, as acusações, as recriminações, atirar de novo exatamente na mesma direção, se possível usando a mesma arma. E recolher os vestígios deixados pelo descuido do criminoso, como uma pegada no chão, uma marca de pneu no asfalto, uma faca suja de sangue na cozinha, pêlos no ralo do banheiro, restos de comida na lata de lixo da calçada. Depois, levar tudo isso
para o bem equipado Laboratório Criminal, onde aparelhos e produtos químicos com nomes complicados irão extrair daqueles objetos aparentemente inutéis a verdade sobre um crime, e a pista para chegar aonde o criminoso está. É no Crime Lab que o
"crime perfeito" começa a ser desmontado para ser recriado nos monitores de computador, na máquina que encontra em segundos a única combinação possível dentre milhões de perfis de DNA, e no AFIS, que encontra também entre milhões a digital que
corresponde exatamente àquela colhida na cena do crime. Com a identificação positiva em mãos, agora é só ir atrás do bandido, já que agora sabemos tudo sobre ele - onde mora, quem é e o que faz,e porque está fichado. É aí que às vezes nos surpreendemos com a revelação saída da máquina de DNA ou do AFIS. O criminoso, o bandido, pode ser de alta periculosidade, condenado e procurado em todo o país, ou pode ser aquele seu vizinho estranho, que não conversa com ninguém; pode ser alguém em quem você mais confiava, até mesmo alguém da família, seu pai, sua mãe, sua mulher, seu filho adolescente, sua filha querida. Às vezes você descobre que seu mais leal empregado está roubando o caixa, que seu melhor amigo está tendo um caso com a sua namorada, que seu marido está te traindo com a sua melhor amiga. E que cidadãos "acima de qualquer suspeita" podem se transformar em maníacos sanguinários, em habéis farsantes, em assassinos covardes; a máscara social de "cidadão de bem" cai por terra e revela a sua verdadeira face. Mesmo o pai de família que parece o mais dedicado pode às vezes se revelar um monstro: comete abuso sexual contra a filha no quarto do casal. A mãe super protetora, capaz dos maiores sacrifícios para proteger os filhos, pode estar nesse mesmo instante colocando veneno na comida deles. As pessoas de quem jamais esperaríamos tais atitudes acabam confessando diante do interrogador o segredo terrível, a falta grave, o desespero que levou a consequências trágicas, causou danos irreversíveis, muito desproprocionais ao agravo. Muitas vezes, uma pessoa, no auge da emoção, na violência da paixão, acaba por extravasar o pior de si: a sede de vingança, o egoísmo, a mesquinhez, a covardia, a possessividade muitas vezes confundida com amor.
A parte mais difícil e dolorosa do processo, aquela que nenhum dos profissionais gosta é a de ter que lidar com os mortos e a comunicar aos vivos a perda de seus entes queridos, é ter que levar o pai ou a mãe, a namorada, o amigo da vítima para
reconhecer o corpo - ou partes desfiguradas dele - guardado na geladeira do necrotério do Departamento de Polícia, uma etiqueta no dedão do pé com o nome ou, se desconhecido, apelidando-o de "John Doe" (fulano), número tal. As lágrimas, os gritos, os desmaios quando o funcionário do necrotério puxa a gaveta e mostra ao parente o corpo do seu ente querido, são de cortar o coração mesmo dos mais experientes. Ver inerte em uma bandeja fria de aço o menino alegre que acabara de ganhar o campeonato de futebol na escola, a garotinha do papai, a mulher da sua vida deve ser a pior experiência, ainda mais quando se sabe ou se desconfia que a morte foi provocada por alguém. Deve ser terrível para um pai ou uma mãe saber que aquela sutura em forma de Y no peito do cadáver do filho indica que os seus órgãos internos foram removidos pelo legista-chefe, à procura de algum indício que revele a COD (cause of death, causa da morte), à procura dos fragmentos da bala fatal, da substância venenosa, de alguma coisa que possa levar a quem fez aquilo. É em cima de uma mesa de aço, com serras elétricas para cortar a carne dos
cadáveres, pias e bacias para recolher e processar vísceras humanas, que a cara da morte se mostra.






O legista Robbins, um simpático e falante velhinho que usa muletas, mostra a Grissom num pedaço de cérebro, num coração recém extraído, numa amostra de tecido humano, a explicação científica sobre como a vítima morreu, por onde e como é que a bala entrou, qual pode ter sido a substância letal que a vítima ingeriu.
Grissom sempre diz a seus subordinados que eles são "a voz da vítima" e que, se os mortos não falam, mostram alguma coisa que pode ajudar a descobrir o que ou quem os matou. Se lutaram pela vida, se reagiram à agressão, deixarão nas suas vestes, nos seus objetos, no próprio corpo a marca do agressor: lesões de defesa, como arranhões e perfurações secundárias, não aquelas que efetivamente causaram a morte; traços do DNA do suspeito nas roupas, sob as unhas, numa taça, num guardanapo de papel, no
controle remoto da TV.Mas todas essas coisas - ou evidências, no jargão técnico dos peritos – e de novo citando o supervisor Grissom – são inúteis se não obtiverem o respaldo do rigor cientifico exigido pelos métodos da investigação forense, se as evidências não explicarem as impressões, se não houver uma correspondência unívoca e inequívoca destas em relação àquelas. Uma suposição – perigosamente eivada de "achismos" ou de julgamentos falhos e precipitados , às vezes até de preconceitos do próprio investigador– é totalmente inválida se não for submetida a rigorosos ensaios químicos, físicos e biológicos e enquanto não for demonstrado que de fato tem sentido, que aquela prova material, testemunhal ou circunstancial é definitiva e inquestionavelmente parte do cenário. No tribunal, diante de juízes e de promotores, uma prova material, por mais evidente que seja, pode ser sumariamente desqualificada se estiver contaminada pelo "ponto de vista" daquele que a coletou, se o crivo moral do investigador for mais importante que o objeto em si.
Quem faz esse todo trabalho é tão humano quanto o criminoso ou a vitíma, e é, apesar de toda a proficiência e treino, passível de cometer erros, de pôr tudo a perder por um deslize, de calcular mal. E os CSI's do nosso seriado são, antes de
tudo, gente de carne e osso; são heróis, mas não super-heróis: se levam tiros morrem, se caem da altura se ferem, sentem dor, ódio, compaixão, torcem o nariz diante de restos humanos em decomposição,choram e se irritam, não são indestrutíveis, não fazem os malabarismos inacreditáveis de outros filmes de "ação" que estamos acostumados a ver. E todos eles - já está na hora de apresentá-los - tem problemas.



Grissom, o supervisor, metódico, autocentrado e extremamente dedicado ao trabalho, quase perdeu a audição, por causa de uma doença hereditária; prefere a solidão de seu amplo apartamento em meio às suas estantes repletas de livros de entomologia, ao convívio com outras pessoas; por isso reluta em assumir de fato a paixão e a atração que sente pela subordinada, a CSI Sara Sidle (Jorja Fox), que também é apaixonada pelo chefe; mas esse relacionamento, contrário às normas do Departamento, tem que ser escondido de todos, custa a se estabelecer, a ser admitido por ambos, e sofre em silêncio a extrema dor de não poder ser aberto ao mundo. Sara, quando criança, viu a mãe esfaquear o pai até a morte, e até hoje vive com os fantasmas do passado; passou a infância e parte da adolescência em abrigos, e já teve problemas com álcool - uma vez foi pega no teste do bafômetro.



Warrick Brown (Gary Dourdan) é viciado em jogo (é uma tentação para ele viver em Las Vegas,onde em cada esquina há um cassino), toma um remédio para dormir e outro para manter-se acordado, e já se envolveu em um caso de extorsão com um juiz corrupto, além de ter que conviver com a culpa por ter não ter evitado o assassinato de Holly Gribbs, uma CSI novata que estava a seus cuidados. Warrick deixou a perita sozinha na cena do crime e foi jogar pôquer num cassino. O suspeito voltou ao local e atirou nela.



Catherine Willows (Marg Hengelberg) que já foi dançarina num clube de striptease, tem uma filha adolescente, um divórcio conturbado, um pai milionário (dono de cassino),suspeito de vários crimes; e, apesar de linda, nunca teve sorte com os homens.



O Detetive Jim Brass (Paul Guilfoyle), foi alvo de uma sindicância interna por que teria atirado num policial durante uma perseguição a ladrões de carro; divorciado, tem uma filha adolescente problemática, prostituída e drogada, e que o odeia mas fica de olho no seguro de vida do pai, quando este se vê entre a vida e a morte depois de ser baleado.




Nick Stokes (George Eads) o mais atlético e corpulento do grupo, ex jogador de basquete na faculdade, revela que foi vítima de abuso infantil por parte de uma babá; no trabalho, foi perseguido por um maníaco, foi enterrado vivo, acusado de matar uma garota de programa, e de deixar vazar uma investigação sigilosa do Departamento. Com tudo isso em seu desfavor, com os traumas e neuroses cotidianas que todos nós vivemos, seria de se esperar que a vida pessoal dos investigadores interferisse de maneira significativa no trabalho deles, chegasse a comprometer o resultado das suas diligências. E é isso mesmo que acontece: uma vez Sara é vista acariciando o rosto do chefe; isto é o bastante para um promotor colocar em dúvida toda a investigação; em outra ocasião, o vício em jogo de Warrick é questionado diante de um júri, e o todo o trabalho que o investigador teve quase demonstra-se inútil; Nick, que é o que mais toma as dores da vítima, muitas vezes chega a agredir um suspeito; mesmo Grissom, um dos mais respeitados e famosos criminalistas do país, tem sua credibilidade posta a prova porque, devido à perda progressiva da audição, não consegue entender a pergunta da promotora no julgamento; Catherine uma vez faz explodir o laboratório, simplesmente porque esquece uma substância inflamável perto de uma fonte de calor; interrogada, ela desabafa: passa dezesseis horas por dia no trabalho, quatro tentando dormir e as quatro restantes tentando controlar os impulsos da filha adolescente. Além disso, não pode investigar os crimes atribuídos ao pai. A complexidade dos dramas morais, afetivos e psicológicos dos personagens é o que os torna humanos como nós, e é o que faz nos identificarmos com eles; no entanto, o profissionalismo, a dedicação, o sentimento do dever, o esforço quase que sobrehumano falam mais alto que as dificuldades: horas e horas extras, dias de sono (eles trabalham à noite) perdidos, risco de morte iminente a cada novo caso, nada disso tira deles a vontade de descobrir a verdade, o amor pela justiça, o empenho para chegar aos culpados e fazer com que estes sejam punidos, para dar algum conforto espiritual aos que perderam um ente querido de forma cruel e trágica.

quinta-feira, 3 de março de 2011

ANTES DO DIA SEGUINTE

Antes foi o tempo de ser
o que se vai contar
Do que deixou para sempre de existir
só eu sei o que será
Quando um dia eu me lembrar
que não me esqueço.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

(sem título)

O leite derramado
tem gosto de pó.

sábado, 29 de janeiro de 2011

sem título

Que seja fantasia isto que eu sinto
Mesmo que me cause dor e alegria
Que só me faça sentido sendo ilusão
Coisas reais foram inventadas pela imaginação:
Antes de existir avião
Ícaro voava.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

É BOM VIVER

A última vez que escrevi aqui (olhem no post anterior) foi em setembro do ano passado. Não que nesse período não me tenha acontecido nada digno de ser registrado, pelo contrário. Os últimos meses foram agitados e movimentados em minha vida, no mau e (mais no) bom sentido. O intervalo entre setembro e aqui, no que diz respeito a este blog, não foi aplicado em manter as postagens em dia por um único e simples motivo, que é um dos sete capitais: preguiça. Eu poderia justificar-me dizendo que tive dificuldades em me conectar, já que fiquei um bom tempo sem internet em casa, e gastar rios de dinheiro nas lan-houses por aí não era definitivamente uma boa idéia; falta de assunto, de novidades, de altas aventuras, também não foi por isso que não tive a boa vontade de sentar na frente de um computador e digitar meninohomem.blogspot.com. Foi por pura preguiça mesmo. Indolência. Se eu estou perdoado por isso, espero que ainda me seja permitido voltar a escrever nesse espaço. De setembro até aqui, como eu já falei, várias coisas aconteceram. Meu país agora é pela primeira vez governado por uma mulher; o crime organizado no Rio de Janeiro recebeu um duro golpe das forças de segurança do Estado; o povo se alimenta melhor, tem mais empregos, compra mais coisas, bugingangas eletrônicas, carros, sonha mais e mais realiza seus sonhos. Há um clima de euforia genaralizada, uma esperança que pode ser vista no olhar de todos. Mas ainda há tragédias, as naturais e as provocadas pela mão do homem, há a miséria, a mancha da violência, há o caos no trânsito, que atrasa a vida e às vezes a interrompe para sempre. Ainda se pode ver naqueles mesmos olhares a falta absoluta de esperança - é uma contradição, sim - a tristeza em ver o trabalho de uma vida sendo levado literalmente por água ou morro abaixo. Ainda há quem não pode comprar, mesmo o indispensável para apenas sobreviver, ainda há quem não tem o direito de sonhar. Quanto a mim, o mais relevante é que entrei na fase dos "enta", da qual eu provavelmente não vou mais sair, a menos que um dia ter mais de cem anos seja possível pra todo mundo. Estou me surpreendendo cada vez mais em como a minha filha está crescendo, em como ela é sensível, bonita e inteligente e cada vez mais (no bom sentido) esperta. O meu trabalho continua a mesma coisa, as pessoas nunca vão parar de ser multadas no trânsito e sempre será necessário notificá-las dos seus erros e exigir delas a reparação imposta pelo Estado. Falo em trânsito, falo da loucura que é circular por esta cidade, e eu mesmo fui "vítima" dele, o trânsito: a duas semanas, numa tarde de quinta-feira como esta, eis que eu estava na rua, em uma grande avenida da região Norte de Belo Horizonte, quando começou uma chuva torrencial. Do outro lado da rua, havia um abrigo de ônibus: querendo manter-me minimamente seco, a minha reação foi correr desembestado para baixo do abrigo. Só que entre o abrigo e eu havia o movimento dos carros. Não deu outra: um deles me pegou. A minha sorte é que o motorista teve o reflexo de frear bem em cima da minha pessoa. Eu fui atigindo lateralmente pelo automóvel (nem deu pra ver a marca). O saldo disso tudo foi, além do susto, uma escoriação no abdomen e ferimentos na mão esquerda, além de uma noite passada na emergência de um hospital público, onde eu vi todo o sofrimento humano: baleados, esfaqueados, politraumatizados, gente em ataque cardíaco, todo tipo de dor. Coisa que impressiona, choca, mas ensina que a vida é apenas uma e que tem muito valor. Já estou totalmente recuperado. E o carro escapou ileso. Bom isso já é passado.
Sinto falta de algumas coisas do meu passado recente, pessoas que eu gostaria de rever estão distantes, projetos que abandonei no meio do caminho eu queria retomar, se é que eles ainda possam ser retomados. Todo dia eu quero ir de novo aos lugares em que vivi, todo dia eu quero reencontrar e reatar os meu laços, os meus vínculos, os meus afetos. Todo dia eu digo que "daqui pra frente tudo vai ser diferente", mas aquele motivo lá do início deste texto me empurra pra trás e me faz ficar parado onde estou. Quem sabe agora?